quarta-feira, 1 de abril de 2009

roteiro

Acho engraçado quando perguntam se está tudo bem, no início de uma possível conversa. Não sei quem é pior: o que pergunta - que definitivamente não está interessado em saber se o outro está bem ou não - ou o que responde - que nunca fala a verdade. Torna-se quase que um código de conduta, um roteiro inconsciente. Eu pergunto, ele responde, ele pergunta, eu respondo. E ninguém foi sincero em toda essa interlocução, mas todos cumpriram com os seus papéis. Papéis. Tudo bem? Ahã. Tudo bem? Na verdade, não. Hoje eu acordei com uma tosse e a minha unha encravada está me matando. Almocei com pressa e de tarde tive um mal estar horrível. Demitiram um monte de gente lá do trabalho e está cada vez mais difícil de arranjar dinheiro. Não gostei da atitude de Fulano, quando se dirigiu a mim por volta das 18 horas. Fiquei mais de uma hora no trânsito. Quando cheguei em casa ainda tenho que arranjar forças para conversar contigo. Não está tudo bem, não. Só queria ficar na minha, obrigado. E nada disso foi dito, mas está tudo escrito nos olhos, na voz e em todas as expressões físicas do interlocutor. Tudo que ele disse foi "ahã". E o pior é quando lemos na cara dos outros que eles não estão bem por nossa causa. Eu sei, essa suposição é subir demais no pedestalzinho mas é o que todos fazemos. E a conversa de louco continua, porque no fundo eu sei o que eu fiz para você estar assim e você sabe que está assim por minha causa mas nenhum de nós está disposto a admitir isso para o outro. E é aí que começa a doença. Vamos combinar assim: eu não pergunto mais para vocês como estão, vocês não me perguntam como eu estou e nós deixamos a conversa rolar falando do tempo ou de cinema ou de tantas outras coisas que ocupam o nosso tempo melhor do que quando estamos pensando sobre nós mesmos. Assim eu não me sinto um idiota me preocupando com uma pessoa que está sempre bem e você não se sente uma pessoa idiota dizendo sempre que está tudo bem, porque não, não está tudo sempre bem, na maioria dos casos.

2 comentários:

Carla Arend disse...

sempre pensei sobre isso
até que um dia respondi "não, não está". e aí fodeu.

Vica disse...

Eu sempre pergunto querendo saber, e as pessoas notam, em geral. E aí, como disse a Carla, phodeu. Porque elas dizem: não, não está, e me contam. Mas tudo bem, eu que perguntei, né? Ou melhor ainda: quem mandou perguntar? ;)

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